Eu não sei....
Na verdade eu nunca sei de muita coisa. Eu apenas sinto!
Dia 523!
Dia 493!
Eu me lembro bem do dia dos pais de 2019!
Era um domingo de sol e o Marcos ainda morava no Badhi.
A mana não tava. Ela havia ido para os lençóis maranhenses com o Cunhas. Ela fez uma escolha!
Eu me lembro que naquele mês versátil da Lara, aquele que tinha o tema de uma música dos Beatles, o velhote segurou a Lara pela última vez.
Eu lembro bem quando naquele sábado a tia Bena me ligou e disse que o papai tava muito doente e já faziam quinze dias.
Era pandemia. Um inferno no mundo todo!
Eu lembro que liguei pra ele e quem atendeu foi aquela mulher. Fria, ela quis crescer pra cima de mim e ouviu o que não quis. A última frase que ele disse pra mim foi "filho, eu não quero briga"
Naquele mesmo dia eu liguei pro mano, ele enquanto médico tomou as rédeas. Ele ainda não tava formado.
O Marcos disse pra maldita fazer x, ela fez y sob a desculpa que o Marcos não era médico ainda e que o sobrinho dela já era e preferiu seguir as ordens dele. Marcos soube só que ele não estava seguindo as recomendações. Eu não tive coragem de dizer pra ela que ela convenceu o velho que o Marcos não era hábil pra isso e o ossan mesmo me disse isso.
Marcos ficou bravo e meio que deixou a coisa nas mãos do outro. Pelo menos foi o que achei. Ele já vinha muito chateado pq a Lara é a primeira neta do primeiro filho homem. Papai tava tão envolvido com a coordenação da praça santuário para o Círio daquele ano que foi a dois mesversários da Lara. Isso chateada o Marcos pq quando ele foi ficou pouco pq aquela mulher não deixava ele em paz.
O Marcos tb verbalizou isso pra mim, dessa chateação e eu não conseguir dizer pro velhote isso.
Foi nesse dia, desse mês de vida da Lara que ele ficou até um pouco mais tarde. Ele chamou a mamãe quando estavam descendo. Ele pediu desculpas a ela e ela o ignorou solene.
Ela tinha suas razões...
Depois disso tudo piorou. A pandemia veio e naquele dia 28 de Abril, um ano depois que o pai dela se foi, depois do meio dia o Marcos entrou pela porta. O resto vcs já sabem.
Não a dor do meu pai não estar aqui pra viver tudo que o pai da Larissa tá vivendo e dele não estar mais acessível ao meu toque nunca passou. É uma chaga aberta que nunca fecha...é uma das três que eu tenho!
É sobre isso que eu queria falar...
Hoje a ficção imitou a vida.
Em 1993, quando José Venâncio morreu na nova lei renascer - personagem era de Taumaturgo Ferreira - a situação era quase a mesma do remake, mas na versão de 2024, os detalhes são tudo. E Deus e o diabo moram justamente nos detalhes.
Nesse, acompanhamos bem o antes. Cada palavra de Venâncio, cada gesto, tudo que verbalizou e até o que não disse, tudo culminou naquela bala.
A teoria do caos diz que quando uma borboleta bate asas na América do Sul, um tsunami atinge a Malásia. Ou seja, cada ação provoca uma reação. Em Buttlerflay effect aprendemos que brincar com o tempo é perigoso e que uma virgula mal pode ser vida ou morte.
A teoria dos multiversos temporais diz que existe um universo primordial e que dependendo das ações tomadas aqui, outras linhas se criam e em outros universos as coisas mudam.
Se a minha sala em 2013 não tivesse ido pra onde foi, qual seria a probabilidade de eu me apaixonar por ela? Se eu não tivesse apresentado a Larissa pro Marcos, será que a Lara, seria somente Laís e filha dele com a Michelle?
O Fernando estava destinado a conhecer a Lene, mas se a mamãe não tivesse putalhado o namoro dela com o Leandro, não seria ele mesmo o meu cunhado? Se o velhote não tivesse sido infiel, ele estaria aqui e será mesmo que ele teria morrido?
Eu não sei dizer se é minha responsabilidade o todo ou em algum momento eu não tenho controle de nada e só devo esperar o resultado...
No caso de José Venâncio a borboleta bateu asas quando Buba o mandou embora. Isso provocou uma reação em cadeia que não podia ser parada. Uma vida era exigida e se não fosse ele, seria João Pedro. Seja o que for, Deus, Krisna, Braman, ou quem seja que rege o universo, colocou aquela pedra e o tiro acertou quem não deveria morrer, ou deveria?
Eu, sinto dor, mas eu me consolo no faro de que eu tava perto dele sempre que ele precisou, que naquele dia dos pais eu pide dizer pra ele o tanto que o amava. Nunca deixei de dizer até no nosso momento mais difícil como pai e filho.
Eu queria ter estado lá com ele, mesmo na pandemia, eu queria ter ido no lugar dele pra ele viver o que o seu Antônio tá vivendo, mas não era meu dia.
E viver as vezes, embora seja uma dádiva também é uma maldição pq ver quem a gente ama ir embora, seja pela morte matada ou morrida, ou porque nos escolhem abandonar é dolorido igual.
Mas não tô reclamando, sou grato, mas é doloroso.
Por isso tento deixar as pessoas com o melhor de mim. Porque eu não sei quando eu vou ver alguém que amo pela última vez.
Eu não sei quem vai primeiro, se eu ou quem está a minha volta, mas que vai ser, isso vai. Não sei dizer quando vou beber água e vai ser a última vez, não sei quando vai ser o dia que vou correr pelo meu percurso e não vou voltar. Não sei se quando eu comer bolo de novo vai ser a última.
Quando estou com Lara e Lucas eu os aproveito bem. Os mimo pq eu olho pra eles crescendo e sei que o meu tempo tá acabando e pode ser a última vez que vou ouvir eles me chamando de tio Don.
Não sei se hoje ou vai ser a última semana que vou ouvir os ron-ron das gatinhas, o miado do cópia querendo carinho ou os lambeijos da Peggy e do Chu.
Se eu não estiver mais aqui amanhã ou daqui um ano vai ter se passado mais de fois anos desde que vi ela pela última vez. Seu olhar de ódio pra mim e sua voz de desprezo. Vai ser uma das últimas coisas que vou lembrar quando chegar meu dia.
Então meu consagrados, se tem um conselho que esse velho eremita, ferido da vida, que sorri forçado, que tem quase nada pra celebrar, eu diria, aproveitem bem a felicidade momentânea que bcs estão vivendo, amem quem diz amar vcs e saibam que tudo isso vai acabar, seja como for vai acabar. Como bem disse o padre Pastor Lívia - em 1993 ele era um padre tb - devemos ter em mente que viver é um milagre, desses que são uma raridade e devemos celebrar a vida.
Deixe todos que vcs amam com o amor de vcs como última experiência juntos!
Talvez assim quando vcs se forem, quem ficar encontre de novo o sorriso nesses bons momentos!
"E do teu beijo
Provar o gosto estranho
Que quero e não desejo
Mas tenho que encontrar
Vem! Mas demore a chegar
Eu te detesto e amo morte
Morte, morte que talvez
Seja o segredo dessa vida!"
(Canto para a minha morte, Raul Seixas)